Se tratando do
Egito, é impossível não lembrarmos das pirâmides, múmias, estátuas de ouro e
bronze. Há 3.000 anos antes de Cristo, a cultura egípcia alcançou a supremacia
nas artes, arquitetura, ciências, confecção de armas, sistema de plantio e
irrigação. Além disso, os egípcios também foram os responsáveis pelo
desenvolvimento do primeiro calendário da humanidade.
Entre lendas e
mitos, a herança da cultura egípcia antiga encanta todo o mundo até os dias
atuais. Arqueólogos e engenheiros continuam a debater como as grandes
construções foram realizadas. Os trabalhos envolviam a extração de grandes
pedras, o seu transporte e o modo de sobrepô-las. As ferramentas eram
rudimentares, mas eficientes. Ao contrário do senso comum, esses trabalhos não
destinados aos escravos, mas sim aos trabalhadores pagos. Estima-se que a maior
das pirâmides, a Quéops, envolveu 100
mil trabalhadores, cerca de 2 milhões de pedras que variam entre duas e
sessenta toneladas e algo em torno de 25 anos para ser concluída. As despesas
eram astronômicas e geralmente consumia todo o produto interno bruto gerado
através da colheita e da arrecadação de impostos. Daí surgiu a famosa expressão
“obra faraônica”, empregada quando se constrói uma obra de enorme volume e de
alto custo.
Pirâmide de Quéops |
Através da
confecção de sarcófagos, no desenvolvimento do complexo processo de mumificação
e na construção de grandes monumentos para guardar o corpo dos seus faraós
juntamente com os seus objetos preferidos, percebe-se que os egípcios davam
ênfase na questão da morte e faziam questão de enaltecer essa prática. Comparando
com a sociedade atual, o sistema capitalista influencia a cultura a não pensar
na morte. Não se aceita o fim da vida porque temos que consumir mais e mais
produtos e esse processo passou a ser um dos principais motivos de se querer
viver.
No entanto, apesar
dessa vertente fúnebre, os egípcios gostavam de festas e de se preparar para
elas. Desse costume que surgiram as maquiagens, as jóias, as melhores cervejas
e vinhos, as vestimentas mais deslumbrantes e o poder de sensualizar. Tais
costumes continuam sendo valorizados, internalizados e praticados.
Admirar Egito
antigo é, ao mesmo tempo, estar diante da morte e da alegria. Vivia-se para alegria
e morria-se para o futuro. Hoje, mesmo que não se queira pensar em morte,
sabe-se que um dia ela vai chegar. Quanto mais se vive no presente, menos se
pensa no futuro. O novo vai substituindo o antigo e com isso a vida vai
seguindo sem um passado, sem uma história – o “fio” da meada se torna
desconhecido. Os egípcios gostavam de construir para as gerações futuras, bem
futuras. E isso era em razão da morte e da necessidade de demonstrar poder, por
acreditar que um dia o corpo ia ressurgir diante dos seus objetos preferidos. Infelizmente
hoje não se costuma ter a noção da finitude da vida.
A múmia de Tutakamon ao lado do seu sarcófago |
Vivenciar o
luto é aceitar e saber lidar com a morte, por mais difícil que isso possa ser.
Retrair o sentimento da tristeza pode causar depressão e fazer com que
situações que poderiam proporcionar a felicidade passem despercebidas. O legado
egípcio além de atrair atenção por resistir bravamente ao longo dos séculos, nos
mostra que o culto à morte deve ser percebido e externalizado. E eles faziam
isso usando as técnicas de construção, da arquitetura e também das artes, era o
costume desse povo e uma determinada época. Hoje, cada um pode viver sua fase
de luto como preferir. Há quem sente aliviado por ir chorar diante do túmulo do
ente querido e quem prefira relembrar os bons momentos vivendo com alegria e
satisfação como uma homenagem a quem se foi. O luto é pessoal e único.
Enquanto
vivemos temos a oportunidade de expressar o luto e refletirmos sobre o que
podemos oferecer para as gerações futuras. Poderá ser um bom exemplo de vida,
uma família bem estruturada profissionalmente e financeiramente, uma pintura a
óleo sobre tela, uma música, um poema, uma árvore. Em fim, temos uma infinita
escolha ao nosso dispor. Viver o presente de forma a também se pensar na
finitude da vida resulta em trabalhar o nosso próprio luto interno. E você, já
pensou qual será o seu legado?
Este texto também foi publicado na revista Sinestesia na edição de maio - clique para ler
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